domingo, 31 de outubro de 2010

JORGE GALPÉRIN

25.10.2010 - Aos meus amigos do meu bairro e a todos os outros meus amigos. Hoje é um dia triste para quem teve como amigo do coração o Jorge Galpérin, argentino, cirurgião de formação e médico de família por devoção. A notícia chegou-me pela Sílvia, a sua mulher. A 25 de Outubro o Jorge tinha saído do Planeta Terra para parte incerta para descansar do seu sofrimento. Se amo Buenos Aires, o Boca, Maradona, Che Guevara, as mães de branco, Evita, Gardel, o tango, a Argentina foi o Jorge que me levou a essa paixão. Até sempre, hasta siempre meu eterno companheiro e um dia vem-nos visitar.

domingo, 24 de outubro de 2010

NA ESQUINA DA LELLO

Mano, te vou contar mesmo. Os kandengues lá do bairro se levantavam cedo, mesmo muito cedo, tipo seis da matina. O liceu não podia esperar e depois de um matabicho bué de fiche, aquilo era uma correria. Uns apanhavam o machimbombo, outros íam mesmo a penantes. Não que não houvesse o passe para ir como os outros mas ir a pé era descobrir coisas sempre novas.
Ali, ainda no bairro e no triângulo da manobra das máquinas dos comboios, subíamos ao estribo da Garrat, ou da Nona e era de boleia até à estação. Depois era atravessar a linha entrar no asfalto e ala que se faz tarde. Kambo para trás, atacávamos a esquina da Lello, descíamos até à livraria Académica, rua fora até ao largo do mercado Vicente Ferreira, depois, tipo bólide bê eme dabliu, a subir onde eles desciam nas 6 horas do Huambo, corta mato até ao Bairro Académico e depois avenida principal até ao Norton de Matos. Sim muitas das vezes fazíamos greve ao Sarmento Rodrigues, a escola comercial e industrial.
Muitas das vezes lhe ficávamos na Lello a ler as últimas novidades e a ouvir os discos que não tínhamos no gira discos do bairro ou na orquestra do Ferrovia, mas nunca atrasados ao Liceu. Outras vezes, noutras correrias, lhe levávamos uma bola, quase sempre de ténis, e a viagem era sempre mais curta pois não lhe recordávamos o trajecto que tínhamos que fazer fruto das brincadeiras e dos chutos que dávamos no destino feito bola de brincar. Te gosto meu Huambo.

sábado, 16 de outubro de 2010

CANHE

Yeah, tou aqui sem saber bem como vou hoje mesmo escrever sobre o meu bairro. Me esqueci de muitas estórias que ali vivi. Talvez cansaço, talvez mesmo só a falta de memória que começa. Mas as lembranças do meu Huambo faz-me sempre bem à mona e começo já, agora mesmo, a me recordar de bué de coisas boas que me aconteceram.
Então vou-te mesmo contar as minhas fugas, sim fugas porque menino branco não podia ir nesse local, ao mercado do Canhe. Nós os putos do bairro passávamos por ali quando íamos para o Ferrovia, mas passávamos no alcatrão bem longe do buruburinho do mercado, das cores, dos cheiros, das conversas, do povo, dos angolanos. Mais velhos começamos a nos desviar mesmo das regras estabelecidas e lá íamos nós entrar na confusão que amávamos. Como era bonito estar ali a ver tudo o que de belo tinha aquela gente e aquele mercado. Bem melhor que o Vicente Ferreira que nem sabíamos quem era o madieu.
Me lembro que não podíamos chegar junto do quintal do padre da igreja local. Nos disseram, boato? verdade?, que o padre tinha dois cães, pastores alemães claro, que estavam treinados a morder os negros, que eram ladrões e os amigos brancos dos pretos, que também eram ladrões e terroristas! Nem chegávamos por perto e aqui comecei a pensar que os servos de Deus não eram todos iguais e que no meu Huambo também havia locais proibidos para quem amava mesmo ele.