Os momentos difíceis da vida de um madieu são mesmo difíceis. E lá no bairro passamos por momentos muito dificeis. Mesmo entre aqueles que tinham cumplicidades e andavam quase sempre juntos. Foi o que me aconteceu com o JC! Não, não pensem que foi com o Homem da túnica branca e de cabelos compridos e barbas. Com Ele também me zanguei e zango com alguma frequência. Ainda há pouco tempo Ele não se portou bem. Mas isso são contas de outro rosário como diria a kota da minha avó.
O JC lá do bairro, o João Carlos, morava logo na primeira casa junto ao triângulo. Kandengue fixe, jogador dos jovens dos Kurikutelas, brincávamos com tudo e com todos. Unía-nos uma amizade e uma solidadriedade que começou desde o tempo de sermos pequenos. A cumplicidade solidificou-se com a morte da mãe do JC. Ali ficaram três putos com o pai a lutarem contra as arguras da vida. O pai não era maquinista como os outros heróis do nosso bairro. Mesmo assim ao JC lhe demos propensão de entrar no grupo. Corríamos o nosso Huambo de lés a lés. A cidade era varrida com as nossas brincadeiras, os nossos risos, as nossas "patifarias". Ele era o Liceu, o Ruacaná, a Kambo, o bilhar no Nacional, o Ferrovia, os jogos contra os do Benfica (outro bairro lá do kimbo), a leitura de A Bola, o nosso Benfica, a discussão, o machimbombo. Partilhávamos e sentíamo-nos bem.
Um dia, numa das nossas discussões houve uma disputa azeda de palavras, foi-se a dis ficou a puta que o pariu, e acabou esta amizade por dois anos. Silêncio absoluto, escuridão permanente, tristeza no olhar, paragens de machimbombo desencontradas, passeios opostos, vidas separadas. Tinha morrido a mãe do JC há pouco tempo. Mas havia sempre os outros, amigos das mesmas coisas, que foram juntando os cacos da discórdia e colando a AMIZADE que sempre existiu.
Vivemos juntos em Luanda e por motivos de outras makas separamo-nos em setenta e cinco do século passado. Nunca mais nos encontramos. Hoje sei que continuamos amigos e tenho saudades deste JC. Kandandu JC!