quinta-feira, 24 de setembro de 2009

O NOSSO LEITE

Yeah! Era mesmo deste leite que os candengues bebiam todos os dias lá no meu bairro. Se o kumbu que precisávamos para a coca.cola que ao fim da tarde bebíamos na Kambo viesse nas latas do leite NIDO então hoje cada um de nós andava a mostrar aos caluandas como é ser rico. Mas verdade mesmo, este leite tinha qualquer coisa que ainda hoje quando nos encontramos falamos nele. Muitos de nós ainda nos lembramos do gosto que o pó que envolvia o nosso indicador tinha quando, surrateiramente, o metíamos na lata e, às escondidas da mãe, o degustávamos como fosse o néctar da palmeira. Era fantástico o gosto que o leite em pó tinha e as emoções que sentíamos.
Claro que à falta do leite materno esta era uma vantagem de podermos beber este fantástico alimento até bem tarde. Depois as latas vazias serviam para as numerosas brincadeiras que tinhamos ao fim da tarde lá no bairro. E rolavam, e serviam de alvo aos tiros e pedradas da nossa meninice, e serviam de tambor para as nossas canções, e até serviam para, ao final da tarde, engaiolarmos insectos e outros bichos. Só os mosquitos não conseguiamos. Mas verdade, com este leite nunca ouvimos falar de obesidade infantil! Ou sería da utilidade que dávamos à lata depois de vazia? Certo, certo é que a marca fez enriqucer uns tantos e quem a bebeu (quantos litros terão sido para cada um de nós?) não ficou milionário!

domingo, 13 de setembro de 2009

SANJO

Os putos lá do bairro, pelo menos os de cor de pele mais clara, tinham uma maneira interessante de se "fardarem" para irem para a escola. Além da roupa habitual havia sempre uma bata branca bordada com o nome de quem a usava e o nome da escola, bata que era utilizada todos os dias e que lavada com o célebre detergente OMO lhe dava um cheirinho fresco de que todos gostávamos. A bata tapava muitas riquezas e muitas misérias mas colocava-nos a todos no mesmo chão e no mesmo país, em igualdade. Além da bata havia uma farda verde e castanha com um cinto que possuía na fivela um S enorme, usada para algumas ocasiões e que servia para um regime se identificar. Pobre regime que identificava os seus cidadãos mais jovens com este tipo de farda completamente fora de moda!
A bata servia para todos nós nos sentirmos iguais sem diferenciação pela maneira como nos vestíamos. Mas para nós rapazes havia uma peça do nosso vestuário, que usávamos nas aulas de ginástica, que faz parte do nosso recordatório da vida e que usávamos com uma alegria sem paralelo. Falo dos ténis Sanjo, brancos, de uma elasticidade ímpar, confortáveis e que davam para toda a prática física dos nossos pés. Desde o trampolim, movimentos no solo, salto de cavalo, futebol, andebol, vólei, as Sanjo para tudo serviam e para tudo eram utilizados, tratando muito bem os pés de quem as calçava.
No futebol muitos de nós usávamos os ténis tentando não os estragar e sujar muito por causa das reprimendas que a seguir tinhamos que ouvir. Mas o impressionante era que nesses mesmos jogos as Sanjo eram dribladas, com umas reviangas do outro mundo, por pés descalços, pretos por cima brancos por baixo, dos nossos amigos do bairro e de outros bairros que até pelos sapatos que usavam pareciam ser angolanos de outro país. Desigualdades de quem mandava e de quem gostava de mandar vestir fardas verdes e castanhas com o tal S na fivela dos cintos e que estava fora de moda. Os ténis Sanjo sempre ficaram no nosso coração, pois depois de algum uso serviam para calçar os pés descalços do nosso bairro, enquanto as outras fardas muito cedo nos recusávamos a vestir pois serviam para manter muitos angolanos descalços.